Muitas coisas ressoam no curso de autogestão. Me parece que outras reflexões virão. Mas a primeira delas é sobre o tempo, inclusive por ser o prazo, até hoje. Quinta feira, 19-12-2013 o dia final do nosso acordo junto com entraves institucionais da universidade.
Ainda em uma reflexão ingênua que vai nortear estudos futuros duas questões me parecem centrais. Uma boa definição pra autonomia e para a autogestão. Antes de fazer vários autores conversar esse texto vai ser feito sem uma pesquisa apurada.
A experiência de autogestão é uma busca pela organização coletiva da vida, pela criação de normas próprias de regulamentação da sua própria vida, incluindo aí o trabalho, a alimentação, o lazer, a circulação pela cidade e tudo mais que está presente no cotidiano e às vezes nem mesmo pode ser nomeado. É importante pensar que ao usar o pronome SUA, quero dizer nossa. Ou seja, se tratando de algo que diz respeito a uma esfera que inclua o coletivo e o individual. Neste sentido eu a princípio entendo a autogestão como um exercício em busca da experiência de autonomia. Claro, entendendo que a autonomia como algo que nunca vai ser pleno.
Hoje existe uma palavra que está sendo dita, repetida e reutilizada. Essa palavra é o comum. Palavra que procura uma nova síntese de valores que a afastem de muito que foi dito sobre o marxsismo e/ou o socialismo real. A experiência de autogestão envolve muitas dificuldades da construção do comum. De algo que é gerido por muito, organizado à várias mãos.
Acho que o tempo é central nessas reflexões sobre tentativas de iniciativas autogestionadas. Seja no Centro Acadêmico ou nos relatos sobre o Ocupa Rio, na construção de um curso autogestionado sobre autogestão ou na assembleia do Largo que hoje toma muitas das minhas reflexões me parece que algumas particularidades se sustentam e se cruzam.
O Negri em SP falou sobre uma temporalidade autônoma. Pra relatar esta diferença da experiência de tempo nesses espaços que buscam sua própria organização. Esta experiência temporal é uma experiência outra, de resistência que nos escancara o modo como em geral vivemos. Experiênciamos o tempo pautado por outras instituições. “Externas e internas” que nos compõem, nos atravessam, ora nos guiam, ora nos confortam.
O experiência de autogestão nunca é eficiente, quando transpomos aquilo que vivemos em um cotidiano apressado, onde o tempo é esquadrinhando e pensado em relação a sua produtividade. Esse olhar não é possível quando tentamos construir algo comum. O comum leva outro tempo, o tempo de decisão é lento, é outro. No curso acho que temos bons exemplos disso, sobre o cronograma e sobre as tomadas de decisões.
A experiência de criação do curso ocorreu de maneira corrida, pois havia as exigências da instituição. Éramos poucos, e muito empolgados. Tínhamos um prazo curto, fomos muito eficientes.
Agora toda vez que decidíamos algo no grupo maior, éramos mais lentos. Por vários motivos, e alguns deles vou me ater em textos futuros. (Talvez).
No filme sobre Oaxaca, vimos que alguns povos indígenas tinham assembleias que poderiam durar até 3 dias. Esta é uma experiência de construção de consenso que parece surreal. Ter muita gente debatendo, e pensando em ações conjuntas durante dias. A Lurdinha nos colocou quanto tempo foi preciso até que uma ação de ocupação fosse tomada, o Carlos e o Felipe, nos apontam para o tempo que demora até a construção de alternativas comuns. Entre eles há de comum o fato desse também ser o tempo da própria vida, da luta pela habitação, pelo trabalho e moradia, pela construção do seu espaço, no mato, no campo, ou na cidade. Para nós, nos restava algumas horas em um dia na semana.
Não é preciso mais de uma hora de assembleia pra se sentir cansado, às vezes tive a sensação de que o curso produzia pouco. Mas me parece que esta é uma sensação que está ligada a produto, ou fim. E acho que é importante para os processos autogestionários entenderem que o foco é no processo, não no produto. Por vezes a experiência breve de relativa autonomia já se torna um acontecimento. Quando começamos a questionar certezas antes verdadeiras como rochas, a fazermos pequenas mudanças no cotidiano, a criar ações que tornam uma instituição mais porosa, começamos a desatar fios que se entrelaçam e criam muitos nós. Que amarram nossa vida, nossos movimentos, nossas ações. Este curso certamente foi um pouco disso. Estar ali de 13:30 às 16:30, para construir um caminho comum deixa claro que a construção do comum não tem tempo. Ela dura quanto tem de durar e por isso não seja fácil.
Como diz o Negri, é uma temporalidade que envolve inclusive o gerenciamento da própria temporalidade. Por isso é tão difícil e talvez tão surreal, um curso autogestionado, uma assembleia na rua, um acampamento de fim de semana, talvez sejam alguns dos espaços que às vezes nos permitimos gerir-mos coletivamente nós mesmos. E aí temos outra experiência de tempo, que não é eficiente, que demora o tempo da criação de vínculos, de expressão de potencialidades, de organização, reflexão e planejamento das ações, de investimento cognitvo e afetivo. Essa experiência pode nos fazer pensar em todo o resto do tempo que vivemos pautados por instituições, compromissos, afetos, sentimentos, medos que nos alienam da construção do nosso próprio modo de viver. O tempo para a construção da autonomia, em meios autogestionados leva tempo, muito tempo, e quem sabe até o tempo todo da vida : )
Toni